Entendendo o indivíduo como um todo que inclui corpo, mente, psique e alma/espírito; e a saúde como a capacidade do indivíduo de se auto cuidar; pode-se inferir que autoconhecimento, auto responsabilidade, qualidade de vida, resiliência e conexão com o espiritual são então, pontos importantes para promoção da saúde integral do indivíduo. Ressalta-se aqui que “espiritual”/“espiritualidade” é entendida como aquilo que fala do significado e do proposito de vida para cada um, algo individual que pode ou não incluir a crença de um deus/deuses. Quando a vida tem um propósito e um sentido, o indivíduo busca cuidar de si.
O Ocidente vem, cada vez mais integrando práticas orientais, algumas milenares, outras não, ao conhecimento médico cientifico ocidental, promovendo assim uma visão integral no âmbito da saúde, olhando o indivíduo como um todo e como alguém capaz de se auto cuidar, ou seja, de se harmonizar.
Jung (1865-1961), médico psiquiatra e psicoterapeuta analítico, também traz essa visão de saúde falando de completude e equilíbrio, e não de perfeição: “Meu princípio é: pelo amor de Deus, não seja perfeito, mas tente, por todos os meios, ser completo – tenha o significado que tiver” (Jung, Fundamentos de Psicologia Analítica, p.91).
O indivíduo saudável é aquele que está em busca do desenvolvimento, do realizar-se, integrando-se ao todo, transmutando e transcendendo. Quando não há movimento e quando a energia não flui, temos um indivíduo doente. Jung coloca ainda ser fundamental que o indivíduo se engaje no seu próprio processo de cura, e para isso o curador deve auxiliar o paciente a encontrar seu “curador interno”.
Psicologia Contemporânea
A Medicina Ocidental, muitas vezes, ainda tenta tratar a pessoa apenas “a partir de fora” e baseia-se muito na patogênese. É fundamental que o homem passe a ser olhado a partir do seu interior e que a saúde seja vista como algo que vai além do “simplesmente não ter doença”, a direção é para que as doenças sejam prevenidas, mantendo o indivíduo saudável.
Assim sendo, a psicologia contemporânea, integrativa e sistêmica, busca estudar e estimular as capacidades e potencialidades humanas, bem como sua criatividade, capacidade de amar, crescimento, necessidades de satisfação, autorrealização, identidade, saúde psíquica etc. Ela se concentra na experiencia humana e afirma que sentimentos, desejos e esperanças são tão importantes numa teoria abrangente do comportamento quanto são as influências externas. Ela enfatiza, também, que os seres humanos devem ser estudados e cuidados como organismos integrais e traz uma visão bem mais otimista do homem, desfocando da psicopatologia e enfatizando a saúde, o bem-estar, o potencial de crescimento, desenvolvimento e autorrealização.
Dentro da concepção integrativa e sistêmica de saúde, o autoconhecimento é ponto essencial para o desenvolvimento de uma vida saudável. Ressaltando que as interrelações, nesta concepção, são parte intrínsecas do autoconhecimento.
No processo de cura, o autoconhecimento é fundamental, pois traz ao indivíduo a consciência de como ele está, quais seus recursos e suas fraquezas, o que faz mal e o que faz bem, para que então ele consiga se curar.
Psicologia Analítica Junguiana
“Tenho uma razoavel certeza de que podemos mostrar a uma pessoa o que existe, mas não podemos lhe dar aquilo que ela deve fazer […]. Não haveria dificuldade na vida se a pessoa sempre soubesse de antemão como fazer uma coisa. A vida é uma especie de arte, e não uma estrada reta ou um produto pronto que se pode encontrar em cada esquina […] Ninguém pode vivê-la por você ou em seu lugar. Sua vida é aquilo que você tenta viver. Se eu precisasse fazer você passar por alguma coisa, seria a minha vida e não a sua”. (Jung, A Natureza da Psique).
Para Jung, o indivíduo traz algo seu ao nascer, uma potencialidade inata, uma determinada estrutura psíquica, ele não nasce uma tabula rasa. Ele coloca ainda que o ambiente não é absolutamente determinante, podendo ser um facilitador, um dificultador ou um impeditivo do desenvolvimento. Trazemos o inconsciente coletivo ao nascermos e vamos desenvolvendo o nosso inconsciente pessoal ao longo da vida.
Ele defende a ideia de que o homem nasce naturalmente saudável, apesar de conter a doença em potencial. Diferindo aqui de Freud, para quem o indivíduo nasce com instinto de vida e de morte. Segundo Jung, a doença é uma transformação do normal e o indivíduo saudável é aquele em busca do seu próprio caminho, aquele que flui no caminho da individuação.
Individuar-se é o realizar sua essência, viver com significado profundo, tornar-se si mesmo, ter consciência do Self[1], perceber o Self e se perceber sendo ele.
Na individuação busca-se o todo, busca-se integrar as várias partes de si. E esse desenvolvimento sempre começa com o confronto moral do indivíduo/ego, com as características que ele não aceita sobre si mesmo e com as características que o indivíduo não quer que chegue a sua consciência (sombra[2]). Vale ressaltar que enquanto o indivíduo não estiver pronto, não deve se mexer: não se deve cortar o casulo da borboleta porque o esforço que ela faz para rompê-lo é importante para estimular a sua transformação – se cortarmos o casulo de uma borboleta, ela não desenvolve a capacidade de voar! A pressa é inimiga da alma, e a perfeição é o anseio do ego.
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[1] Self, o centro do todo e o todo; organiza a personalidade total; a psique do indivíduo. Não deixa nada de fora, visa a totalidade; soma do inconsciente com o consciente. É o “deus interior” (Fernandes, 2012, p. 43).
[2] Sombra é o que se reprime ao longo do desenvolvimento da personalidade por não parecer adequado ao ideal de ego. Todo indivíduo é acompanhado de uma sombra, e quanto menos ela estiver consciente, mais escura e espessa se torna. É sentida como inadequada, primitiva, vulgar e incomoda (Jung, 1978, p. 81).