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Yara Kilsztajn

Psicóloga Junguiana, especialista em Psicoterapia Corporal e Orientação Vocacional/Profissional.

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Desafios de como ser Pais nos dias atuais

Nas gerações passadas, a dinâmica familiar era quase sempre desenhada da mesma forma: pai trabalhando fora e a mãe cuidando da casa e da educação dos filhos.

Os meios de comunicação eram limitados e criavam-se os filhos com uma rigidez quase militar. O que faz muitas pessoas visualizarem essa sistemática como a única que realmente funciona e consegue formar pessoas de bem e adultos responsáveis.

Na atual conjuntura, uma mudança cultural levou a mulher ao mercado de trabalho e a responsabilidade pela educação dos filhos passou a ser dividida com toda a família. E, muitas vezes delegada a babás, professores particulares, escolas, clubes, nutricionistas etc.

A tecnologia e o acesso fácil à internet abrem um mundo de informações e estímulos a crianças e adolescentes. Há quem diga que essa nova geração deveria ser educada da mesma forma que os nossos pais e avós foram criados.

Os tempos mudaram, mas será que também mudou a forma como pais e filhos se relacionam?

O “melhor sistema” para a educação de filhos não existe

A tarefa de criar e educar os filhos é realizada de diversas maneiras, variando muito, dependendo da época, da cultura e do estrato social em eles encontram-se inseridos. A forma que hoje o mundo ocidental cria “seus filhos” não é única e, provavelmente, também não é a melhor forma possível. Por isso estamos constantemente vendo e revendo formas de educar crianças e adolescentes.

Como diz o subtítulo desse artigo, o “melhor sistema” para a educação de filhos não existe! Por exemplo, na Idade Antiga, as classes superiores romanas, que queriam fazer de seus filhos guerreiros qualificados e homens de estado capazes, tinham que educar seus filhos diferentemente dos cristãos primitivos, para os quais a maior preocupação era fazer com que seus filhos aprendessem a amar a Deus e assim ganhassem o paraíso.

As metas de nossa educação mudam praticamente a todo o momento, antes a cada 10 ou 20 anos e hoje chega a mudar de um ano para outro. Hoje, logo que formulamos um estilo de educação, surge uma nova imagem modelo de homem e a meta educacional precisa, consequentemente, mudar também. Por essa razão, entre outras, é impossível avaliar a eficácia de uma forma de educação em particular.

Então, podemos concluir, nas palavras de Guggenbuhl-Craig, analista junguiano, que, independentemente de nossos esforços, os vários sistemas de educação exprimem simplesmente nossas próprias fantasias e concepções sobre educação, respondendo à questão de como as crianças devem ser formadas para se tornarem os adultos que queremos que sejam.

Qual a meta educacional da nossa sociedade atual? Que tipo de pessoas queremos formar?

O mais difundido sistema de educação atual ocidental prega o controle parental cuidadoso sobre nossos jovens da infância à adolescência, promovendo pessoas com fortes sentimentos e ligações pessoais, mas que tendem a ser continuamente desiludidos pelo grande mundo quando começam a perceber que nem todas as outras pessoas são tão amorosas quanto “papai” e “mamãe”. O grande problema desse sistema de educação é o fato dele ser e desenvolver indivíduos narcisistas. A grande vantagem é que se estimula uma maior capacidade de amor pessoal. Vale lembrar que apesar desse ser o modelo educacional “escolhido” e “defendido” como “correto” em nossa sociedade atual, nem todos os filhos, por motivos diversos, recebem esse tipo de educação. Mas, de qualquer forma, esse é o modelo visto com bons olhos pela nossa sociedade.

Mudança cultural, culpa e narcisismo

Com a inserção da mulher no mercado de trabalho, tanto o pai, quanto a mãe, passaram a ficar mais tempo fora de casa, consequentemente, terceirizando o cuidado com os filhos, seja na escola, atividades extracurriculares ou cuidadores.

Diferente das gerações anteriores, os pais atuais se veem cobertos de culpa por não passarem tanto tempo com os filhos. Isso também é reflexo da própria criação que receberam, mais distante e menos emotiva. Por algum tempo várias linhas da psicologia defenderam que o importante era a qualidade do tempo que se passava com os filhos, e não a quantidade, amenizando o sentimento de culpa dos pais. Durou pouco, hoje essa premissa já é questionada.

Para suprir as necessidades emocionais dos filhos, os pais costumam substituir as horas de companhia por bens materiais, estimulando o consumismo exagerado e sendo permissivos, na ilusão de que estão levando sua criação de forma livre, sem a rigidez com que foram criados e de que se ressentem tanto.

O medo de não serem realmente amados pelos filhos faz com que evitem qualquer tipo de frustação e ao menor sinal de desconforto emocional da criança ou adolescente, algo deve ser feito imediatamente para evitar que sintam dor, sofrimento ou infelicidade.

Há também o desejo de perfeição que é projetado nos filhos. Estes devem ser os melhores: os mais competentes, com maiores habilidades (intelectuais, emocionais, sociais, esportivas, artísticas etc.), mais altruístas (desde que não percam o primeiro lugar no pódio ou na fila, é claro) e muito felizes e realizados… compensando, assim, a infelicidade e a falta de sentido que muitos adultos vivenciam em suas próprias vidas; ou compensando aquilo que lhes foi negado na infância e juventude.

É importante, enquanto pais, nos perguntarmos: a quem estamos tentando agradar? Aos nossos filhos, a nós ou aos outros?

Muitos pais, mesmo sem perceber, mesmo inconscientes dessa atitude, querem que seus filhos sejam o que eles queriam ser e não são, ou não foram. Podem também usar seus filhos como “troféus” perante familiares e amigos, numa tentativa narcísica e desesperada de mostrarem ao mundo como são pais extremamente competentes e bons: precisam se sentir e serem reconhecidos como pais perfeitos para se sentirem inteiros.

Alguns, ou melhor, vários pais, divorciados ou não, competem entre si para saberem quem é o melhor pai/mãe, o mais competente, ou qual é aquele de quem o filho mais gosta. É fácil intuir que essa competição não é nada saudável, nem para os filhos, nem para os pais.

Os filhos, neste contexto acima apresentado, costumam ocupar um lugar central na vida familiar, sobrecarregando-os de atenção, ”hipercuidado”, “hiper exigência” e gerando uma sensação de “dívida” imensa para com seus progenitores (ou cuidadores). Precisam ser perfeitos e amar seus pais/cuidadores incondicionalmente. Ser o centro da família por um longo período (infância, juventude e, muitas vezes, se estendendo à vida adulta) tem um preço muito caro a ser pago. Ao tentarem agradar seus pais, os filhos muitas vezes acabam distanciando-se em demasia do que eles realmente são e querem para si mesmo. Apatia, baixa autoestima, imaturidade, depressão e ira incontrolável são algumas das consequências possíveis num quadro como este, quando não olhados, cuidados e transformados.

Mas calma, todos nós – pais, filhos, sociedade – estamos em constante aprendizado, não somos perfeitos, erramos e vamos continuar errando muito… faz parte da vida. Mas também é inerente ao ser humano desenvolver-se enquanto individuo e enquanto sociedade, transformando e transmutando-nos. O aprendizado faz parte de nossa trajetória. Olhar atentamente e com “carinho” para nós mesmos, para nossos pais e filhos, para a dinâmica familiar em que estamos inseridos é o primeiro passo para modificarmos aquilo que não está funcionando muito bem. O processo psicoterapêutico é uma das maneiras, não a única, de auxiliar o individuo neste caminho, já que promove e facilita o autoconhecimento através da escuta apurada e sem julgamento por parte do profissional.

Mimados, egocêntricos e privados de contato humano

A criança, mesmo muito pequena, monopoliza e “manda” na casa. A alimentação, por exemplo, fica a critério do paladar dos filhos, seja saudável ou não. Aqui encontramos novamente um sobrepeso para os filhos: controlar uma casa e ter que se haver com tantas opções de escolha é muita responsabilidade para uma criança, mesmo que, aparentemente, ela pareça extremamente satisfeita com esse poder todo. Uma criança pequena ainda não tem discernimento do que é certo ou errado, do que pode ou não pode fazer.

Por outro lado, há sempre alguém para arrumar os brinquedos, o quarto e o material escolar, até mesmo dos adolescentes. É preciso que o adulto decida coisas por ela e pela casa, é preciso que o adulto imponha limites e ensine-a que cumprir regras vai fazer parte da convivência dela em seu meio social.

Crianças, e até bebês, têm acesso a celulares e tablets desde pequenos, uma solução que se mostra eficiente ao menor sinal de choro ou insatisfação. Esta é uma distração cada vez mais recorrente, que prende aquele pequeno indivíduo em um mundo onde não há a necessidade de interação com outras pessoas; onde a frustração é mínima; onde a espera é nula e onde seus atos (geralmente o toque do polegar num visor) não geram consequência alguma (não desenvolvendo a noção de responsabilidade pelos seus atos). Este cenário precisa ser visto e cuidado. Já há, por exemplo, evidências de sintomas autistas em crianças muito pequenas devido ao uso indiscriminado de aparelhos eletrônicos em detrimento do contato humano, contato este que é fundamental para o desenvolvimento emocional, motor e cognitivo do individuo.

Conforme vão crescendo, a internet também entra em suas rotinas, trazendo informações sobre variados assuntos (algumas vezes inverídicas ou improprias para idade da criança) e amizades virtuais que podem ser bastante negativas (e até mesmo criminosas).

Na ânsia de acertarem e protegerem os filhos, muitas vezes os pais da atualidade formam indivíduos mimados e egocêntricos, que não sabem lidar com pessoas e com sentimentos como fracasso, frustração, tristeza etc.

O equilíbrio como aliado na educação

Nem tão rígidos como foram criados, nem tão permissivos como estão criando seus filhos. Todos nós sabemos que a diferença entre remédio e veneno está na sutileza da dosagem.

Se no passado alguns de nós fomos educados de forma severa, não necessariamente devemos repetir com nossos filhos e, uma relação mais amorosa não vai interferir de forma negativa na criação de um indivíduo.

Ensinar os filhos a organizar os brinquedos, o quarto ou ajudar em pequenas atividades domésticas não vai fazer com que eles amem menos os pais, ao contrário, vai trabalhar seu senso de responsabilidade e deixa-los mais independentes. O exemplo deve vir dos próprios pais e cuidadores.

Mas será que não enxergamos os erros que cometemos, tentando acertar na educação dos nossos filhos? Muitas vezes não, pois, por mais que tentamos acertar, temos nossos pontos cegos e nosso limite humano (não somos perfeitos!).

Buscar ajuda não desmerece o papel dos pais

Cresce muito o número de pais que se preocupam em entender as reais necessidades de seus filhos e formar indivíduos mais preparados para viver em sociedade. E esta não é uma luta solitária.

Nos dias atuais as mudanças de uma geração a outra é muito mais intensa do que antes, o mundo gira muito mais rápido, tornando mais difícil a percepção, a escolha e a ação do que e de como lidar com nossos filhos e com nós mesmos enquanto pais e educadores. O mergulho no mundo virtual das crianças e adolescentes e as questões de gênero (leia sobre este tema no próximo artigo) são bons exemplos disso. Educar exige dedicação, amor, responsabilidade, maturidade, consciência e, “cá entre nós”, muita paciência! Você não vai ser menos pai ou mãe se procurar ajuda de profissionais, escolas ou livros. Educar não é uma tarefa fácil, nem simples.

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