O termo Calatonia deriva da palavra grega “khalaó”, que significa relaxação, alimentação, afastar-se do estado de ira, abrir uma porta, desatar as amarras de um odre, deixar ir, perdoar os pais, retirar todas as vendas dos olhos etc.
(Sandor e outros, “Técnicas de Relaxamento”, 1982).
O que é Calatonia e como ela pode ajudar no processo psicoterapêutico?
A Calatonia, mais do que uma técnica, é um método de relaxamento constituído de toques sutis aplicados pelo terapeuta nos pés e pernas do paciente (também podendo ser realizada nas mãos e braços, ou na cabeça). Ela inclui o contato bi pessoal, a sutileza e toques com poucas variações de movimento, promovendo um alcance amplo, favorecendo trocas psicofísicas e facilitando o acesso a imagens inconscientes. Consegue-se, com isso, um “alargamento da consciência”. Esse alargamento é fundamental para termos uma nova perspectiva e/ou uma nova postura diante de nós mesmos e da vida. A partir do trabalho corporal de Calatonia, o indivíduo pode transformar criativamente suas relações pessoais e profissionais, sua vida e a si mesmo.
Quem e como foi desenvolvida?
Petho Sandor, médico húngaro, desenvolveu este método de trabalho corporal durante a Segunda Guerra Mundial, com base nas observações feitas em casos de reabilitação de feridos e congelados. Num hospital da Cruz Vermelha, ele atendeu às mais diferentes queixas na fase pós-operatória, desde membro fantasma e abalamento nervoso, até depressões e reações compulsivas. No Brasil, Sandor ampliou seu trabalho alinhando-o à psicoterapia analítica. Os “Toques Sutis” (aqui incluída a Calatonia), como ficou conhecido seu método de trabalho corporal, são toques que podem ser aplicados em diversas áreas do corpo, em especial nos pés, articulações e coluna vertebral. A estimulação feita suavemente pela pele propaga-se naturalmente através das conexões neurológicas existentes no organismo, atingindo o sistema nervoso no seu todo e possibilitando a integração psicofísica.
Ressalta-se que integração psicofísica é uma abordagem da psicologia que entende o ser humano como uma unidade na qual as expressões físicas e psíquicas constituem apenas diferentes aspectos de uma mesma e única totalidade. Assim, a própria “fala do corpo” é entendida como “expressão simbólica” do que se passa na psique de um determinado ser. E se o corpo é expressão válida da totalidade psíquica, intervir sobre este corpo é também um meio de intervirmos, sincronicamente, sobre o organismo como um todo. A psique e a matéria são um mesmo fenômeno observado respectivamente do interior e do exterior do indivíduo.
A sequência dos toques da Calatonia foi proposta por seu criador com referências aos meridianos chineses, ao do-in, à reflexologia e aos chakras (filosofia indiana), mas sempre com o sentido de amplificação e não de explicação.
Como a Calatonia transforma o indivíduo?
Segundo Sandor, quase todas as escolas analíticas ou psicoterapêuticas experimentaram os diferentes métodos de relaxação para conseguirem que, em tempo mais curto, o indivíduo se reestruture pela nova coordenação dos seus valores existenciais, e também pela introspecção, vivência e ação. Através do toque suave da pele, uma variada gama de sensações pode vir à consciência. Usando a sensibilidade cutânea, a Calatonia pode eliciar lembranças, imagens e vivências, as mais variadas.
A Calatonia possibilita uma afirmação e apresentação de problemas em forma de imagens, em cenas ou sequências delas. Deve-se tomá-las como informações, conceituações, fantasias e/ou sonhos, permitindo simplesmente que se manifestem, sem que o terapeuta as force em um esquema interpretativo.
A “monotonia do toque” na Calatonia leva o paciente a uma interiorização capaz de diminuir a atividade do ego, podendo levá-lo a entrar mais em contato com conteúdos até então inconscientes, através de imagens possuidoras de símbolos integradores que, quando chegam à consciência, podem ser capazes de promover transformações necessárias dentro de um processo de individuação. Como diz Sandor ( ): “Os conteúdos que estavam potencialmente presentes tornam-se neste momento conscientes e contribuem para reajustar o intercâmbio entre consciente e inconsciente, possibilitando ao indivíduo um comportamento novo e mais adaptado” (Sandor, “Técnicas de Relaxamento”, 1982).
É importante destacar que o contato físico entre paciente e terapeuta facilita a constelação do arquétipo curador-enfermo, estimulando-se o curador interno no paciente. Assim sendo, as imagens calatônicas surgem com o conteúdo indicado para o paciente naquele momento. Quando o ego se encontra em uma situação para a qual não há saída visível, o inconsciente constela conteúdos compensatórios, como solução possível para o problema. A Calatonia, à medida que proporciona o movimento da libido do ego para o inconsciente, pode facilitar a constelação dessas imagens (aqui entendida em seu sentido mais amplo, incluindo visão, tato, audição, percepção e movimento).
Podemos dizer ainda que a Calatonia favorece o contato do indivíduo com o numinoso, ou seja, com uma força psíquica que encerra um significado ainda não revelado e que produz no ser humano uma carga emocional de uma intensidade tal que o transforma. Temos então aqui um alargamento de consciência.
O rebaixamento da atividade do ego favorecido pela Calatonia pode promover o surgimento de imagens carregadas de numinosidade que, integradas a um ego estruturado, podem levar a uma transformação orientada para um reposicionamento favorável e a uma mudança de atitude frente a vida. Mas é importante lembrar que um ego frágil pode não conseguir organizar as imagens surgidas, podendo ser contraindicado a utilização da Calatonia (por isso a necessidade em se procurar um profissional devidamente capacitado para lidar com o físico e o psicológico das pessoas).
O símbolo, quando aparece na consciência, é vivido como uma verdade maior do que as possibilidades de explicação, uma vez que ele nunca poderá ser abarcado em sua totalidade. A auto regulação energética é regida pelo Self (centro do indivíduo) e não pelo ego,embora este seja de suma importância para que o símbolo possa ser conhecido e integrado à consciência e, com isso, promover a transformação que se faz necessária naquele momento.