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Yara Kilsztajn

Psicóloga Junguiana, especialista em Psicoterapia Corporal e Orientação Vocacional/Profissional.

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COVID–19 e a Realidade Surreal

As lembranças de alguns filmes não param de vir a minha mente.

Do recém grande premiado no Oscar, Parasita, passando pelo óbvio Epidemia e terminando no maravilhoso O Sal da Terra, documentário sobre o grande fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado.

Em Parasita, a fala do pai (Song Kang-ho), em meio a um galpão/abrigo, após a calamidade decorrente da intensa chuva e consequente inundação de várias regiões da cidade, para seu filho (Choi Woo-shik) me fisga a todo momento: ele fala (não sei precisamente suas palavras, mas foi o que ficou em mim registrado) que não é possível prever as coisas, que não temos o controle de nada, que nada é garantido. Ou seja, ele fala da nossa “pequenez” diante do mundo, da nossa frágil ideia de controle da nossa vida, em que nossos planos, vontades e, aqui eu acrescento, mesmo as ideais que temos de nós e dos outros de repente se rompem, desfazem. As vezes são surpresas positivas, outras não. E como lidar com as surpresas negativas que nos tiram o chão? Como lidar com as incertezas decorrente desse “destrilhamento”?

No filme citado acima, filho e pai seguem caminhos bem diferentes (e, aqui, não vou dar spoiler… para aqueles que não viram o filme, vejam!). Qual o caminho que podemos seguir frente as pedras que surgem em nossos caminhos?

É aqui que o filme O Sal da Terra me encanta e comove, trazendo fé e esperança. Nele consigo ver, pelas lentes de Sebastião Salgado, a beleza no feio e na dor, e, pelos passos deste e de sua esposa, toda a esperança e reconstrução da vida (novamente sem spoiler… assistam o filme!).

Estamos passando por um momento de reclusão, de angústias grandes e concretas e de angústias “pequeno burguesas”… ambas intensas, reais e verdadeiras, que exigem um olhar cuidadoso. Momentos de pânico, dúvidas e confusão, mas também um momento de pausa, de possibilidade e elaboração e reelaboração, de contato íntimo (mesmo que fisicamente distante), de comunicação, solidariedade.

Momento que nos obriga e nos convida a olhar tanto para dentro de nós (e encararmos nossas belezas e nossas feiuras, como nosso egoísmo, por exemplo) como para fora, para o parceiro, para os filhos, pais, colegas, vizinhos, seres humanos, planeta terra.

Um mergulho diferente que vem sendo vivido para muitos com muita tensão e medo. Mas esse mergulho também pode promover transformações ricas e significativas. Um momento para revisitar situações e relações; reelaborar as que ainda se fazem presentes pela dor (como os pequenos e grandes traumas); apreciar e trazer mais para perto, para dentro de nós, aquelas que nos deram e que nos dão força.

Momento para se conectar com o real, tirar vendas, refletir, enfrentar de frente, com muito cuidado, amor, compreensão e acolhimento, o que está em nós (sentimentos e pensamentos) e ao nosso redor.

Momento de se conectar com a Grande Sabedoria, com os Arquétipos da Velha Sábia e do Velho Sábio (referência à psicologia junguiana), da Sabedoria que habita cada um de nós, mesmo que muitas vezes esquecida, abandonada, distante ou aparentemente ausente.

Nesse cenário atual, faz-se necessário cada um buscar o que lhe faz bem: voltar-se para si numa introspecção, falar e trocar sentimentos ou apenas bater um papo com os amigos on-line, desenhar, fazer exercícios físicos em casa, escrever para si ou para o mundo todo ler, meditar, rezar, ajudar os outros on-line, cuidar mais de si etc. Pergunte-se: o que lhe faz bem e é possível de você realizar nesse momento?

Que cada um de nós, e a humanidade como um todo, supere da melhor forma possível essa pandemia. Que possamos, a partir dela (que está aqui, presente, querendo ou não!), transformamo-nos e tornarmo-nos pessoas mais autoconscientes.

Termino esse texto desejando muita sabedoria e resiliência a todos nós!

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